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Inovação no Cultivo: O Robô CNC de Baixo Custo para a Agricultura Urbana em Santa-Cecília, Cantá - Roraima

A crescente demanda por soluções sustentáveis e inovadoras no setor agropecuário, especialmente no contexto urbano, impulsiona a adoção de tecnologias que promovam eficiência e precisão no cultivo de alimentos. Neste cenário, apresenta-se o projeto  @viveirolab : um robô CNC de baixo custo, adaptado para a automação de cultivos, que alia a robustez da tecnologia CNC à sofisticação de sistemas de monitoramento avançados. Foto: J. Caraumã. Sobre o  @viveirolab O início do projeto tem respaldo na urgente necessidade de viabilizar a cultivação de hortaliças, ervas e outros vegetais em ambientes urbanos de caráter restritivo e em recursos escassos.  Inspirado em ideias de automação industrial, é que o projeto sugere a conversão de uma matriz CNC tradicional para utilização em serviços agrícolas de alta acurácia para otimizar planta, rega e manutenção das culturas.  O robô foi projetado ainda por meio de suporte de tecnologia de impressão 3D para possibilitar a criação de ...

A Morte da Cachorra Baleia em Vidas Secas

Eis, neste escrito, uma breve transcrição das páginas de "Vidas Secas", obra primorosa de Graciliano Ramos, onde se retrata o derradeiro suspiro da infortunada Baleia.





O nono capítulo de "Vidas Secas" (1938), de Graciliano Ramos, em que o narrador descreve a morte da cachorra Baleia, é certamente o capítulo mais lido e lembrado em toda a obra do escritor alagoano (falo por mim 😁).

Com papel revestido em humanidade que transcende a própria sensibilidade humana, Baleia se destaca dentre todos os personagens por seus sentimentos cristalinos e profundos. 

A cena em questão decorre a partir da suspeita de que Baleia sofre de Hidrofobia (também conhecida como "Raiva"), e portanto, Fabiano decide sacrificá-la, enquanto Sinhá Vitória leva os dois meninos para dentro de casa e tenta lhes tapar os ouvidos e lhes poupar da tragédia que segue. 

Separe o lenço e segure o coração, pois a descrição da cena é antológica:



(...) Examinou o terreiro, viu Baleia coçando-se a esfregar as peladuras no pé de turco, levou a espingarda ao rosto. A cachorra espiou o dono desconfiada, enroscou-se no tronco e foi-se desviando, até ficar no outro lado da árvore, agachada e arisca, mostrando apenas as pupilas negras. 

Aborrecido com esta manobra, Fabiano saltou a janela, esgueirou-se ao longo da cerca do curral, deteve-se no mourão do canto e levou de novo a arma ao rosto. 

Como o animal estivesse de frente e não apresentasse bom alvo, adiantou-se mais alguns passos. Ao chegar às catingueiras, modificou a pontaria e puxou o gatilho. A carga alcançou os quartos traseiros e inutilizou uma perna de Baleia, que se pôs a latir desesperadamente.

Ouvindo o tiro e os latidos, sinha Vitória pegou-se à Virgem Maria e os meninos rolaram na cama, chorando alto. Fabiano recolheu-se.

E Baleia fugiu precipitada, rodeou o barreiro, entrou no quintalzinho da esquerda, passou rente aos craveiros e às panelas de losna, meteu-se por um buraco da cerca e ganhou o pátio, correndo em três pés. 

Dirigiu-se ao copiar, mas temeu encontrar Fabiano e afastou-se para o chiqueiro das cabras. Demorou-se aí um instante, meio desorientada, saiu depois sem destino, aos pulos.

Defronte do carro de bois faltou-lhe a perna traseira. E, perdendo muito sangue, andou como gente, em dois pés, arrastando com dificuldade a parte posterior do corpo. Quis recuar e esconder-se debaixo do carro, mas teve medo da roda.

Encaminhou-se aos juazeiros. Sob a raiz de um deles havia uma barroca macia e funda. Gostava de espojar-se ali: cobria-se de poeira, evitava as moscas e os mosquitos, e quando se levantava, tinha folhas secas e gravetos colados às feridas, era um bicho diferente dos outros.

Caiu antes de alcançar essa cova arredada. Tentou erguer-se, endireitou a cabeça e estirou as pernas dianteiras, mas o resto do corpo ficou deitado de banda. Nesta posição torcida, mexeu-se a custo, agarrando-se nos seixos miúdos. Afinal esmoreceu e aquietou-se junto às pedras onde os meninos jogavam cobras mortas.

Uma sede horrível queimava-lhe a garganta. Procurou ver as pernas e não as distinguiu: um nevoeiro impedia-lhe a visão. Pôs-se a latir e desejou morder Fabiano. Realmente não latia: uivava baixinho, e os uivos iam diminuindo, tornavam-se quase imperceptíveis. (…)

Abriu os olhos a custo. Agora havia uma grande escuridão, com certeza o sol desaparecera.

Os chocalhos das cabras tilintaram para os lados do rio, o fartum do chiqueiro espalhou-se pela vizinhança.

Baleia assustou-se. Que faziam aqueles animais soltos de noite? A obrigação dela era levantar-se, conduzi-los ao bebedouro. Franziu as ventas, procurando distinguir os meninos. Estranhou a ausência deles.

Não se lembrava de Fabiano. Tinha havido um desastre, mas Baleia não atribuía a esse desastre a impotência em que se achava nem percebia que estava livre de responsabilidades. Uma angústia apertou-lhe o pequeno coração. Precisava vigiar as cabras: àquela hora cheiros de suçuarana deviam andar pelas ribanceiras, rondar as moitas afastadas. Felizmente os meninos dormiam na esteira, por baixo do caritó onde sinha Vitória guardava o cachimbo. (…)

Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. E lamberia as mãos de Fabiano, um Fabiano enorme. As crianças se espojariam com ela, rolariam com ela num pátio enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo cheio de preás, gordos, enormes.



 Referências

[1] RAMOS, Graciliano Vidas Secas, Record, 74ª edição, 1998


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