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Mitologia Indígena: Olhar Tupinambá sobre a Origem do Mundo
A criação do Universo contada a partir do olhar mitológico indígena da tribo dos Tupinambá.
"Nesse mundo inaugural, misterioso e obscuro, era o Velho". Desenho que fiz a lápis em Papel Canson - A4. |
Que seja dito, "Meu Destino é Ser Onça", livro de Alberto Mussa, é uma maravilhosa contribuição aos estudos das culturas indígenas do Brasil.
Buscando "restaurar" a narrativa mitológica da tribo tamoio (os tupinambá do Rio de Janeiro), concebe um texto único a partir da leitura cruzada de fragmentos e registros feitos pelo frade André Thevet sobre a cultura indígena durante a ocupação da Baía de Guanabara, em 1550, incluindo outras fontes dos séculos XVI e XVII.
Pode-se dizer ainda que o imaginário produzido a partir do olhar e das referências dos indígenas brasileiros é tão rico e profundo quanto o de outros livros fundadores da cultura Ocidental, e ainda, sem dever nada aos gregos. Tenha uma ótima leitura.
E o céu foi feito de pedra. E o Velho começou a caminhar por ele. Todavia, quando olhava para cima, ainda via as trevas primitivas. Deve ter sentido uma tal necessidade de beleza que, para ornamentar o céu, concebeu a terra- completamente lisa, completamente plana. Achou tão bela essa nova criação que quis morar nela.
Mas o Velho estava só. Foi quando decidiu criar os homens, esculpidos em troncos de árvores. Para alimentá-los, o Velho fazia uma chuva fina fecundar a terra. E da terra brotavam as árvores, e das árvores brotavam os frutos. O pau de cavar ia sozinho desenterrar as raízes. As flechas iam sozinhas caçar os animais. Sem trabalho, os homens apenas comiam, bebiam e dançavam.
E o Velho frequentava todas as ocas, e dançava, bebia e comia com eles. Os homens mostravam respeito pelo Velho: limpavam o caminho em que ele ia pisar. Quando ele chagava, ofereciam uma rede, para que descansasse, e choravam diante dele. Um dia, o Velho chegou numa aldeia- mas, para sua surpresa, ninguém veio limpar o caminho, ninguém lhe ofereceu uma rede, ninguém chorou diante dele.
Parecia que o Velho não existia, que não tinha sido ele quem criara os homens. O Velho, então, imaginando que estivessem loucos, foi procurar outra aldeia. No entanto, o descaso se repetiu. E se repetiu novamente. Aquele comportamento foi se tornando geral. O Velho concluiu que os homens tinham se esquecido dele. E se sentiu completamente só.
Revoltado com a ingratidão humana, o Velho fez descer do céu um fogo devastador. No entanto, entre todos os homens, havia um que não era mau, que nunca tinha deixado de honrar o Velho: o Pajé do Mel. Assim, enquanto o fogo queimava a terra, enrugando e encrespando sua superfície- e formando as montanhas e as depressões- o Velho pôs o Pajé do Mel a salvo do fogo, numa região hoje desconhecida.
O Pajé do Mel assistiu à fúria do incêndio, que matava os homens e aniquilava a terra. “Velho, porque destruir o céu e o seu ornamento?... E agora? Onde faremos nossa oca?” Mas logo percebeu que a intenção do Velho era ficar no céu; e que ele, o Pajé do Mel, viveria sozinho naquele recanto da terra poupado das chamas.
O velho, então se comoveu. E com seu poder misterioso, criou Tupã. E Tupã correu pelos quatro cantos do universo, provocando assim uma tremenda tempestade. E o aguaceiro do céu extinguiu o fogo da terra. E as águas torrenciais dessa chuva correram pelas montanhas e pelos regos formados durante o incêndio, arrastando as cinzas de tudo que fora queimado, até encher uma imensa depressão, dando origem ao mar.
Por isso, porque as águas do temporal provocado por Tupã arrastaram consigo as cinzas das coisas queimadas, o mar é tão salgado e de paladar tão ruim. E o Velho, observando a terra, vendo que ela estava toda envolvida pelo mar, achou que tinha ficado ainda mais bela.
Por isso moldou o Velho a primeira mulher, para que o Pajé do Mel povoasse a terra de homens melhores. Quando o casal olhava para cima, podia ver o velho, segurando seu cajado. O Velho é Túibae, a primeira constelação que apareceu no céu."
Referência:
Meu Destino é Ser Onça. Alberto Mussa. Editora: Record Quanto. 2008.
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